sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Capítulo Primeiro


Origens da tradição do realismo materialista na Grécia antiga.

Muito antes dos ocidentais, os sábios da Índia já haviam formulado sistemas de pensamento nos quais a realidade era originada a partir da composição de micro partículas de matéria. No ocidente até onde sabemos, o primeiro filósofo a postular uma idéia semelhante foi Leucipos, nascido no início do quinto século AC, em Abdera ou Mileto. Ressalta-se que esta última localidade, atual Turquia, na época uma colônia grega, de caráter cosmopolita, favorecia o intercâmbio cultural entre o mundo ocidental e a Ásia. O atomismo está na base do empreendimento intelectual do ocidente, junto com as demais escolas pré-socráticas.

“Um dos maiores legados da história da humanidade é a construção do que se pode chamar de cosmovisão científica: um olhar sobre a Natureza, ou seja, sobre a Physis, tal qual era entendida pelos gregos. A origem do processo dessa cosmovisão, lento e fascinante, corresponde à origem e ao florescimento da Filosofia e da Física na Grécia antiga”.
(CARUSO & OGURI, 2006, P. 1).

A natureza da matéria – ou simplesmente de corpos extensos dotados de certas propriedades – foi uma questão intrigante para os filósofos antigos, e ainda é para os físicos contemporâneos...”.
(CARUSO & OGURI, 2006, P. 1).

Entre 440 AC e 430 AC, o filósofo fundou em Abdera uma escola de filosofia onde deu prosseguimento às suas pesquisas. Segundo ele, tudo era composto por átomos. Os átomos eram micro elementos indivisíveis e inextinguíveis, que, combinando-se e acumulando-se, davam origem aos corpos e coisas. Demócrito foi aluno de Leucipos em sua escola e viria a se tornar o grande difusor do atomismo grego. Segundo Demócrito, o universo é feito unicamente de matéria, e a matéria é formada por átomos (do grego, “átoma”, que significa unidade indivisível). Nesta teoria, os diversos estados da matéria davam-se às diversas formas dos átomos.
Os átomos, segundo o Leucipos, não possuem todas as propriedades que nossos corpos percebem na natureza. Suas propriedades seriam apenas algumas, tais como peso, forma e tamanho. As demais propriedades da matéria, que percebemos sensorialmente, seriam decorrentes das interações múltiplas e complexas entre os átomos que constituem nosso corpo e os átomos constituintes dos objetos com os quais interagimos. Para Demócrito, esta interação entre as partículas constituintes da matéria deveria ser exclusivamente local, não havendo possibilidade de processos físicos à distância, ou, não-locais. No início do Cosmos, segundo ele, todos os átomos rodopiavam caoticamente, até que através de inúmeras colisões eles se agruparam, permitindo a formação de matéria e das primeiras estruturas do universo.

“Do ponto de vista atomístico, o que é (o Ser) não é necessariamente Uno, podendo repetir-se um numero infinito de vezes. A matéria não pode ser criada ou destruída, e o Universo é constituído de corpos sólidos e de um vazio infinitamente extenso. Logo, o átomo e o vazio constituem a essência do materialismo da filosofia atomística. Cabe notar que o vazio, na teoria de Demócrito, não é simplesmente nada (a negativa do Ser), já que ele serve de sustentáculo para o movimento dos átomos...”.
(CARUSO & OGURI, 2006, P. 8).

O atomismo grego, que visava explicar a composição de todas as coisas baseando-se no postulado de que só a matéria é real, encontraria outros defensores ainda no período clássico. Nascido em 341 AC, em Atenas, Epicuro fundou uma escola de filosofia, onde, longe do burburinho do centro ateniense, com seus mercados e falantes, junto com seus amigos, ele dedicar-se-ia às investigações filosóficas. De acordo com os acadêmicos (a Academia era a escola fundada por Platão, bem como o Liceu o fora por Aristóteles) que dividiam a filosofia em três áreas, sendo elas, a Ética, a Lógica e a Física, Epicuro apresentou idéias nestes três campos. Para ele, tal como para Demócrito, o universo é formado por átomos, porém, se para Demócrito os átomos despencam no vácuo, traçando uma trajetória específica, para Epicuro eles estavam sujeitos à desvios espontâneos e não causais. Tais desvios poderiam gerar realidades imprevisíveis, abrindo na realidade uniforme a possibilidade de novas e múltiplas configurações.
De toda forma, os próprios atomistas não apresentaram uma tese para a origem do movimento dos átomos. Contudo, ressaltemos que tal filosofia repercutiu no pensamento elaborador da Física Clássica, mesmo com tal lacuna sobre a origem do universo:

“Entretanto os atomistas não chegaram a apresentar argumento algum que justificasse o movimento inicial dos átomos, o que corresponde a aceitar uma descrição puramente causal de seus movimentos, pensando apenas no resultado da colisão entre átomos, sem se preocupar com o movimento primeiro. Esse ponto de vista – de certa forma aceito e desenvolvido por Newton – foi criticado por Aristóteles, ao escrever: Leucipos e Demócrito, que dizem que os seus corpos primários estão sempre em movimento no vazio infinito, deviam especificar o tipo de movimento que lhes é natural.”
(CARUSO & OGURI, 2006, P. 8).

Enfim, toda esta tradição incutiu na cultura ocidental, arraigando em nosso pensamento, a crença de que todas as coisas são feitas de matéria, e que o homem é apenas um objeto material, enfim, de que não existe nada além da materialidade atômica, e incluiríamos; do espaço-tempo, e das forças que atuam e organizam a matéria.

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